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sexta-feira, 6 de maio de 2011

Nada de novo sob o sol 1

Corria o ano de 1916. O frio congelava os ossos naquela manhã de junho. No dia anterior, a rádio anunciava que havia geado em todo o estado de São Paulo. A mãe tentava manter a  filha de 22 dias aquecida junto ao corpo, já que cobertor havia um só. Pelo menos essa vantagem a pobreza trazia: pais e filhos tinham que ficar juntinhos, para que se aquecessem mutuamente.
O dia já estava clareando, e Bastião acabava de se levantar. Deixava que a mulher dormisse, e ele mesmo preparava o café.  Tinha pena dela, que estava ainda cansada do parto complicado e dos cuidados todos que um bebê requer. Além disso, o serviço doméstico era puxado, e ele sabia que o dia da mulher seria longo, mais do que o seu.  Levantou-se e, com seu jeito bonachão, preparou-se para sair. Bastiana ouviu o barulho do marido  e, embora quisesse permanecer na cama, não conseguia. Sempre fora assim: uma vez de olhos abertos, estava em pé. Levantou-se a tempo de dar bom dia ao marido e vê-lo partir.
Pelos seus cálculos, ainda teria um tempo antes de Maria do Carmo acordar. Ela havia mamado fazia umas 3 horas. Respirou fundo e sentou-se à mesa, pensando em como sua vida havia mudado nos últimos meses: a gravidez não planejada, a gestação conturbada, o parto que quase a matara. Agora, tinha aquele embrulhinho sobre a cama, e tudo a assustava. Na verdade, desde que o bebê nascera ela não conseguia relaxar. Tudo a preocupava: se a filha chorava, se ficava muito quietinha... Lembrava-se sempre das palavras da mãe: "Bebê é como passarinho, numa hora está vivo, noutra está morto." Seria assim mesmo?
 De repente, um chorinho a trouxe de volta à realidade. Carmo havia acordado. Correu para o quarto, e encontrou sua filha com os olhos abertos, mas ainda perdidos na escuridão.  Pegou-a e percebeu que os panos que a enfaixavam do pescoço aos pés estavam encharcados. Despiu-a com cuidado, para que não sentisse muito frio, e a enrolou novamente. Sentia um amor que não sabia definir, nem de onde vinha. Só sabia que era bom.

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