Total de visualizações de página

sábado, 7 de maio de 2011

Nada de novo sob o sol 2


Frei Alfons era um homem de princípios rígidos e riso contido. Ao acordar, fazia suas orações, tomava um banho gelado e sentava-se à mesa para tomar o café, que Sebastião já havia preparado - todos os dias, um ovo cozido e um café bem forte, sem açúcar. Bastião não conseguia entender "as esquisitices" do padre, mas  sua fé de homem simples o fazia servi-lo  com zelo e devoção. Já estava naquele emprego há muito tempo, desde que perdera a avó, único parente que conhecera neste mundo. Era um tipo de “faz-tudo”: preparava o café, consertava o que havia pra ser consertado,  mantinha a pintura da igreja, e o que mais gostava: cuidava do jardim. O jardim da casa paroquial era o mais lindo da cidade – pelo menos, era o que ele achava. Embora o espaço não fosse tão grande como ele gostaria, fez questão de cultivar as mais variadas flores  e folhagens; seu orgulho era um arbusto-borboleta, que fazia as senhoras da vizinhança darem uma paradinha cada vez que passavam a caminho do armazém ou de outro lugar qualquer. Havia um  ipê amarelo, que esperava a proximidade da primavera pra florir,  e um limoeiro que era o xodó do padre –  essa era a única parte do jardim que era cuidada por ele,  junto com um canteiro de ervas e temperos que ele chamava de “tesorros”, no seu português cheio de sotaque.
Frei  Alfons  gostava de sentar-se na varanda todo final de tarde e, às vezes, antes de dispensar Bastião, contava histórias de sua infância  em Bedburg, que Bastião não sabia onde ficava, mas sabia ser longe. Quando frei Alfons chegou,  Bastião estranhou o jeito sério; afinal, frei Antônio, o pároco anterior, era do tipo brincalhão e risonho. Conviveram diariamente durante quinze anos, até que uma pneumonia  levou o frei num dia triste de inverno. Bastião chorou como quem perde um pai.
 Então, um mês depois, enviaram frei Alfons.  No início, Bastião falava o indispensável com ele, temeroso de ser inadequado. Além disso, tinha uma dificuldade enorme de entender aquele jeito de falar todo enrolado. Bastiana o acalmava, e dizia que o tempo iria resolver as coisas. E resolveu; Bastião acabou se afeiçoando àquele homem grande e branco que nunca sorria. E  percebeu que, por trás daquela carranca, havia um grande coração.



Nenhum comentário:

Postar um comentário